No seu Primeiro Sermão
(Quint 57), Meister Eckhart reflete sobre o chão da alma e a relação
da alma com as figuras externas. Para ele, a presença do Deus
Desconhecido no ser só pode ser concretizada no espaço vazio da
alma, um espaço essencial e original que não pode ser ocupado por
imagem alguma; é vazio em essência e IMPERCEPTÍVEL pelos sentidos.
Sobre a alma, é dito
que todo trabalho que ela exerce é feito com suas forças; a
compreensão pelo intelecto, a lembrança pela memória e o ato de
amar por meio da vontade. Logo sua atuação provém da força, e não
de sua essência. Seus atos de força são direcionados ao externo,
enquanto a essência da alma não exerce atividade alguma: "Todo
ato externo está ligado a algum meio[...] Mas na essência da alma,
ali não ocorre atividade alguma, pois as forças ali empregadas
provêm do chão do ser." Este "chão do ser" seria
acessível APENAS por Ele.
Entrada de Meister Eckhart na igreja de Erfurt, com a inscrição "Das Licht leuchter in der Finsternis, und die Finsternis hat es nicht erfasst." (A luz brilha nas trevas e as trevas não prevalecerão contra ela)
A alma utiliza dos
sentidos para que interprete as imagens exteriores, o que corresponde
ao “dar sentido”; um homem não pode interpretar a figura de um
menino como a figura de um cavalo, pois o sentido vem de fora através
dos sentidos e é percebido pela alma. Nada vem de dentro, portanto
torna-se impossível perceber o que opera na essência e como se dá
o processo. Sendo assim, a percepção é limitada nas imagens
externas que chegam até a alma e queda impossível à alma possuir
uma imagem de si mesma, ela carece de tal.
Dentro da gnose
hiperbórea, afirma-se que dar sentido aos entes pode conformar um
ato danoso ao processo espiritual. Dar sentido AFIRMA o mundo
material a qual o iniciado exerce oposição. O mundo é repleto de
formas em um sem-número de estágios evolutivos dentro da teoria do
processo espiriforme finalizado na enteléquia, logo o virya
que dá sentido despreocupadamente corre o risco de encontrar-se
preso ou atraído pelo objeto em si, sendo este o passo inicial para
uma eventual fagocitação.
O problema da
fagocitação também pode ser relacionado ao pensamento exposto no
sermão. Eckhart se opõem à ideia de que nada há na alma senão
imagens. Uma alma que contivesse apenas imagens jamais poderia ser
abençoada, pois nenhuma criatura ou elemento externo, nenhuma
imagem, pode ser a felicidade de uma pessoa. Obviamente a falta de
felicidade ou senso de completude é resultado da carência de
transcendência na vida do ser, pois a falta desse princípio
equivale ao encerramento das possibilidades mitológicas interiores
e, logo, do processo psicológico de totalidade – isso se nos
atermos ao campo gnosticamente limitado da psicologia; sobre isso
Jung já dissera:
"A carência do
sentido impede a plenitude da vida e significa, portanto, doença. O
sentido torna muitas coisas, talvez tudo, suportável. Jamais alguma
ciência substituirá o mito e jamais o mito poderá nascer de alguma
ciência."(JUNG, C. 1986, p.111)
Dessa forma, o frade
coloca que deve-se postar no chão, na essência, que é o único
lugar isento de imagens e onde pode vir a surgir o contacto com o
Deus Desconhecido em sua essência simples. Sendo que não temos
imagem alguma exceto aquelas externas a nós, pois a alma não
projeta uma imagem própria, a felicidade através de qualquer
imagem é impossível. O senso de plenitude procede de uma
transcendência na essência, no chão da alma, na origem, e essa
mesma elimina o perigo da fagocitação no externo.
Estando ciente do que
é a percepção do externo, surge o conceito do aquietamento e do
silêncio, da Abgeschiedenheit, para que de tal forma se
manifeste a obra ISENTA DE IMAGENS. Meister Eckhart nos diz que
aquele que vive uma vida de retidão nos ensinamentos de Jesus Cristo
e tem uma boa conduta natural, que atue dessa forma sem perceber,
deve exercer o silêncio para que o Deus Incognoscível atue na parte
interna da alma, e assim que todas as forças forem retraídas de
todos os seus trabalhos e imagens a "palavra secreta" (DUM
MEDIA SILENTIUM TENERENT OMNIA ET NOX IN SUO CURSO MEDIUM ITER
HABERET, ETC. Sap 18:14) poderá ser dita. Valendo-se dos
conhecimentos hiperbóreos, pode-se traçar uma analogia do exposto
pelo frade até o Virya que, estando familiarizado com a ética
noológica e com a tipologia que não é lúdica nem sacralizante,
age com os princípios do espírito de forma NATURAL e já não
necessita mais de constantes referências externas para vivenciar sua
forma natural, já tocada pelo Selbst. E, nessa práxis, pode
suceder a manifestação do que nos é análogo à "palavra
oculta"; o canto dos siddhas eternos, a língua dos
pássaros, o mistério rúnico, toda aquela essência que está
inclusa no espírito e não pode, pelo que já foi exposto no texto,
ser representada inteiramente com símbolos externos pois CARECE DE
SENTIDO NO MUNDO EXTERIOR. Certos textos gnósticos recentes
propuseram o fim do diálogo interior – me refiro a Herrou Aragón
- como forma de se aproximar mais da essência espiritual, pensamento
que cabe perfeitamente dentro da proposta dessa análise hiperbórea
do tema. Esse silêncio puramente hiperbóreo, o desprezo pelo
material, vinculado ao atuar hiperbóreo não resulta numa ascese
negativa ao iniciado, mas na possibilidade de superioridade e
vantagem estratégica dentro do Valplads para uma ação livre
de capturas energéticas e psíquicas, assim com a proximidade e
emergência do SIGNO DE ORIGEM.
Como encerramento,
cito o sermão onde Meister Eckhart faz referência a outros dois
pensadores:
Um mestre pagão
disse-o bem, ao constatar de certa feita:
"Estou ciente
de que algo brilha em minha compreensão: posso nitidamente discernir
de que se trata, mas o que é isto - não posso saber. E contudo, se
o pudesse possuir, saberia tudo que há para ser sabido."
E também cita a Santo
Agostinho:
"Percebo que
algo brilha e fulgura diante de minha alma: se estivesse plenamente
aperfeiçoado e estabilizado, por certo seria a vida eterna!"
“Naturalmente, el
Signo del Origen sería incomunicable puesto que sólo puede ser
visto por quien posee previamente, en su sangre, el Símbolo del
Origen.” El Misterio de Belicena Villca p.27
“Así se
sintetizaría la Sabiduría de Navután: quien comprendiese el
alfabeto de dieciséis Vrunas comprendería la Lengua de los Pájaros.
Quien comprendiese la Lengua de los Pájaros comprendería el Signo
del Origen. Quien comprendiese el Signo del Origen comprendería a la
serpiente. Y quien comprendiese a la serpiente, con el Signo del
Origen, podría ser libre en el Origen.” El Misterio de
Belicena Villca p.28
ECKHART, Meister. Os
sermões alemães completos. Tradução de Marcos Beltrão.
JUNG, Carl. Memórias,
sonhos e reflexões. Editora nova fronteira: 1986. Tradução de Dora
Ferreira da Silva.